CARTA ENVIADA PELO ESPÍRITO DE CÁSSIA ELLER
O Lar de Frei Luiz, centro espírita localizado no bairro de
Jacarepaguá, no Rio, confirmou, segundo o jornal Extra, que, a carta foi
psicografada no local. Segundo o presidente, Wilson Pinto, a mensagem foi
recebida por um médium na noite de 7 de maio, durante uma reunião de
dependência química.
Espírito relata período no "umbral"
Na mensagem, Cássia relata o período em que passou no
"umbral", lugar de expiação para o espírito em regeneração, segundo a
doutrina espírita. O termo ficou conhecido após o filme Nosso Lar, baseado na
obra homônima escrita através de psicografia pelo médium Chico Xavier.
Leia a carta que seria de Cássia Eller na íntegra:
"Se eu disser para vocês que o inferno existe, acreditem,
pois eu estava mergulhada nele, de corpo e alma, num espaço sombrio e frio, bem
interno do ser, dos pés à cabeça, sem tempo, sem luz, nem descanso e
afogava-me, a cada segundo, num oceano de matéria viscosa que roubava até minha
ilusória alegria… Naquele lugar não havia luz, somente nuvens cinza e chuvas
com raios e trovões, gritos estridentes e desesperados, gemidos surdos, pedidos
de socorro, lágrimas, desalento, tristeza e revolta…
Preciso descrever mais as cenas dantescas de animais que nos
mastigavam e, em seguida, nos devoravam sem consumir nossos corpos; se é que
posso dizer que aquilo, que sobrou de mim, era um corpo humano. Queria fugir
para bem longe dali, mas tudo em vão, quanto mais me debatia no fluido
grudento, mais me afundava e, quando alcançava, de novo, a superfície
apavorante, mãos e garras afiadas faziam-me submergir naquele líquido pastoso e
mal cheiroso.
Dragões lançavam chamas de suas bocas sujas e nos queimavam,
machucando e estilhaçando a pouca consciência que me restava da lembrança de
minha estada no corpo físico, neste planeta azul. Guardiões das trevas olhavam
atentos seus presos e vigiavam todos os movimentos realizados naquele imenso
espaço de sofrimentos, dores, lamentos, depressões, angústias e arrependimentos
tardios… O ar era ácido e provocava convulsões diversas.
Perguntava-me porque ali estava se nada fizera por merecer tão
infeliz destino, depois de ser expulsa do corpo de carne através do uso maciço
de drogas. A dúvida assaltava-me os raros momentos de raciocínio menos
desequilibrado e as crises de abstinência trancavam todas as portas que dariam
acesso à saída daquele campo de penitência de espíritos rebeldes e viciados com
eu.
Os filmes de horror que assisti, quando encarnada, estariam ainda
muito distantes dos padecimentos, pânicos, pavores e temores que ficariam para
sempre registrados na minha memória mental, os piores dias que vivi até hoje,
como joguete e marionete de forças que me escravizavam o ser, debilitado,
fraco, desprovido de energias, suja, carente e chorosa.
Não me lembrava do que acontecera comigo… Quando o medo é maior
que as necessidades básicas, a mente fica encarcerada num labirinto hipnótico e
“torporizante” de emoções truncadas e desconectadas da realidade… Assemelha-se
a um pesadelo sem fim, sempre com final trágico e apavorante. Quando conseguia
conciliar um pequeno tempo de sono; era imediatamente desperta por seres que me
insultavam e xingavam, acusavam-me de suicida maldita e jogavam-me lama
misturada com pedras… Insetos e anfíbios ajudavam a traçar o perfil horrendo
dos anos que passei no umbral.
Preciso escrever estas palavras para nunca mais me esquecer: “Com
o fenômeno da morte, nós não vamos para o umbral, nós já estamos no umbral
quando tentamos forjar as leis maiores da criação com nossas más intenções e
tendências viciantes”.
Tudo fica registrado num diário mental que traça nosso destino
futuro, no bem ou no mal. O umbral não fora criado por Deus; ele é de autoria
dos espíritos que necessitam de um autêntico e genuíno estágio educativo em
zonas inferiores, onde poderão se depurar de suas construções aleijadas no
campo dos sentimentos e dos pensamentos disformes, mal estruturados e mal
conduzidos por nossa irresponsabilidade, de mãos dadas com a imensa ignorância
que nos faz seres infelizes e distantes da tão sonhada paz de consciência.
Após alguns anos umbralinos, despertei numa tarde serena, num
campo verdejante e calmo. Não acreditava no que via, pois tudo, agora, parecia
um sonho… Percebi, ao longe, o canto de uma ave que insistia em acordar-me
daquele pesadelo no qual já me acostumava a viver; a morrer todos os dias… Seu
canto era uma música que apaziguava meu coração e aguçava meus pensamentos na
lembrança de como fui parar ali naquele campo gramado e repleto de árvores.
Consegui sentar-me na relva e ao olhar todo aquele espaço natural,
deparei-me com milhares de outros seres como eu, nas mesmas condições de
debilidade moral, usufruindo, agora, de um bem que não merecia, mas vivia!
Todos nós dormíamos e fomos despertos com música e preces em favor de todos os
presentes…
A maioria era de jovens e adultos, poucos idosos e centenas de
enfermeiros que olhavam atentos para nossos movimentos no gramado. Com seus
olhos serenos, projetavam em nós a mansidão e a paz tão esperadas por nossos
corações enfermos, débeis e carentes de atenção, de afeto e carinho.
Alguém me tocava, de leve, os ombros e chamava-me pelo nome, como
se me conhecesse há muito tempo. Eu identifiquei aquela voz e “temia” olhar
para trás e confirmar minha impressão auditiva, era Cazuza todo de branco, como
lindo enfermeiro, de cabelos cortados bem curtos e estendia suas mãos para que
eu levantasse, caminhasse e conversasse um pouco em sua companhia.
Não consegui me levantar, porque uma enxurrada de lágrimas vertia
dos meus olhos, como nascente de rio descendo a montanha das dores que trazia
no peito. Meu ídolo ali estava resgatando e cuidando de sua fã, debilitada e
muito carente. Ele cantou pequena canção e tive a capacidade de avaliar o que
Deus havia reservado para aqueles que feriam suas leis e buscavam consolo entre
erros escabrosos e desconcertantes.
A misericórdia divina sempre conspira a nosso favor, nós
desdenhamos do amor divino com nossas desatenções e desequilíbrios das emoções
comprometedoras, que arranham e esmagam as mais puras sementes depositadas no
ser imortal. aprendi palavras boas!
Somente agora enxergo que sou espírito e que a vida continua e
precisa seguir o curso natural das existências, como na roda-gigante: hora
estamos aqui no alto; hora estamos aí embaixo encarnados. Daqui de cima, parece
ser mais fácil compreender porque temos de respeitar as leis e descer num corpo
físico para, igualmente, quando aí estivermos, conquistarmos, pelo trabalho no
bem, a lucidez que explica porque há a reencarnação, filha da justiça divina.
Após um tempo no campo reconfortante, fui reconduzida para um hospital
onde me recupero até hoje dos traumas e cicatrizes que criei no corpo do
perispírito. As lesões que provoquei foram muito graves, passei por várias
cirurgias espirituais e soube que minha próxima encarnação será dolorosa e
expiarei asma, deficiência mental e tuberculose.
Mesmo assim, estou reunindo forças para estudar, pois sempre
guardamos, no inconsciente, todos os aprendizados conquistados. Reencarnarei
numa comunidade carente no interior do Brasil e passarei por muitos reveses,
para despertar em mim o valor da vida do espírito na pobreza e na doença
crônica. Peço orações e a caridade dos corações que já sabem o que fazem e para
onde desejam chegar. Invistam suas forças e energias espirituais em trabalhos
de auxílio ao próximo e serão, naturalmente, felizes. Obrigada por me aceitarem
como necessitada que sou!"
Autor: Cássia Eller
Link para a matéria completa no jornal Extra: